Tribuna Livre: A premente necessidade dos sindicatos no século XXI

Por Cristiano dos Passos e Vânia Mattozo, trabalhadores da Administração Central da Celesc

Os sindicatos sempre foram uma pedra no sapato dos patrões. Por outro lado, por atuarem em defesa dos direitos coletivos da força de trabalho, já gozaram de grande reputação perante aos trabalhadores. Nas últimas décadas do século XX, com o avanço do ideário neoliberal, as entidades sindicais passaram a sofrer um forte bombardeio midiático, principalmente dos grandes grupos de comunicação que representam a classe dominante e seus interesses. Os ataques foram tão frequentes e insidiosos que alcançaram, em grande parte, o seu principal objetivo: fazer com que a classe trabalhadora passasse a olhar para os sindicatos com desconfiança. O cenário instituído foi uma ‘naturalização’ do capitalismo e a sua lógica de exploração, como se os responsáveis pelo desenvolvimento do País fossem os donos do dinheiro, e não os trabalhadores.

Neste século, o avanço tecnológico promoveu uma grande transformação no ambiente de trabalho. Além disso, conceitos como “empreendedorismo”, “meritocracia” e “empregabilidade” entraram no vocabulário ‘descolado’ do mundo do trabalho, o que contribuiu para que muitos trabalhadores trocassem os seus direitos pela ilusão de que poderiam ser donos do próprio negócio e dispor de liberdade para tomar decisões na organização de sua atividade, podendo obter rendas excepcionais ou até mesmo… enriquecer!

Pura ilusão. Uma recente reportagem da jornalista Kate Morgan, para a BBC, aponta que as aparentes vantagens desse modelo de trabalho começaram a se esvair à medida que a nova geração de trabalhadores percebeu que não há espaço para todos no mercado e que a falta de garantias trabalhistas é muito prejudicial no médio e longo prazo, contrariando aquilo que a mídia propaga sobre a suposta autonomia do trabalhador contemporâneo, melhores condições de renda etc. etc. etc. Ou seja, a realidade se impôs ao discurso neoliberal: jornadas intermináveis de trabalho, salários miseráveis e ausência total de direitos começaram a minar essa lógica de ‘empreendedorismo’ para as gerações mais novas, pois, na contramão desse movimento, as empresas aumentaram seus lucros e a desigualdade social cresceu a níveis alarmantes.

A reportagem da BBC mostra que a geração nascida entre a década de 1990 e a década de 2000 é, conforme dados do Centro para o Progresso Americano, “a geração mais pró-sindical que existe atualmente”. Segundo Jaz Brisack, uma das líderes das lutas sindicais na multinacional Starbucks, “há uma compreensão melhor de que se você tem um emprego, precisa de um sindicato”; uma ideia comprovada pelo aumento crescente da sindicalização nos Estados Unidos, país em que, segundo pesquisa Gallup, 71% da população apoia os sindicatos.

Na prática, o que ocorre é isso: esses jovens cresceram ouvindo que teriam empregos tão bons quanto os de seus pais, desde que tivessem uma boa formação. Porém, apesar dos seus esforços, a promessa não se concretizou – a “boa formação” custa mais caro do que seus baixos salários podem pagar, assim como planos de saúde ou a possibilidade de pagar os estudos para a próxima geração. Para piorar, a emergência climática que nos assola em catástrofes cada vez mais frequentes, fruto da exploração desenfreada promovida pela mesma lógica capitalista que prometia um futuro decente, contribui para que esses jovens questionem até mesmo a opção de formar uma família e/ou ter filhos.

A corrosão dessa confiança no futuro está presente no contexto brasileiro. A precarização do emprego torna a vida cada vez mais difícil, as relações entre os trabalhadores e os patrões se tornou mais complexa após a reforma trabalhista e a esperança possível foi deslocada para um “próximo emprego”. Não à toa, há entre os nossos próprios colegas aqueles que estão mais preocupados em estudar para o próximo concurso do que em fazer frente aos desafios e lutar para que o emprego atual seja valorizado.

Mas, assim como nos EUA, esse movimento pró-sindical deve ocorrer no Brasil em breve, principalmente depois que a pandemia mostrou como boa parte da classe dominante, incluindo políticos e empresários, está mais ocupada em manter o sistema funcionando do que em apoiar os trabalhadores.

Cresce, portanto, a certeza de que quem continua lutando para que os trabalhadores tenham uma vida melhor, para que todos nós possamos ter direitos respeitados e mais esperança no futuro, são os sindicatos.

Por isso, para que os sindicatos voltem a ser ‘uma boa pedra’ no sapato daqueles que querem nos tirar direitos, a classe trabalhadora precisa assumir o seu poder de interferir, antes que seja tarde demais. Precisamos de todos, mas especialmente da força dessa nova geração para contrabalançar a lógica neoliberal daqueles que, mesmo sendo também trabalhadores, defendem os interesses do patrão enquanto ocupam posições de poder na estrutura corporativa. Esquecem-se, porém, que o capital não privilegia pessoas – seus meios justificam um único fim: poder para ter mais dinheiro.

Leia mais aqui: https://www.bbc.com/portuguese/articles/c72jknv5m45o?utm_campaign=later-linkinbio-bbcbrasil&utm_content=later-38022031&utm_medium=social&utm_source=linkin.bio.

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