3 pontos sobre fome, consumo de ossos e decaso criminoso de governantes

Neila Maria Viçosa Machado, nutricionista e educadora

– Primeiro ponto: falando de nossas lembranças, memórias alimentares que nos levam a recordar que quando comemos carne com osso, comemos a carne e descartamos o osso. Os ossos não são consumidos por nós e qualquer pessoa – mesmo nossa mãe ou avó que não eram nutricionistas – sabe disso, e nos também sabemos. Ossos não fornecem nutrição porque não são alimentos*, e não dá pra falar de necessidades nutricionais frente a não alimentos. Quando seres humanos são levados para responder à fome sua, e de sua família, a comer não alimento – comer osso é como comer papel, pneu.. – é uma situação que, se durar como está durando em nossa cidade, Estado e país sem que o Estado olhe, e promova uma politica publica que retire estas pessoas desta situação, elas ficarão *desnutridas, e podendo até levar à morte.

– Segundo ponto: é preciso deixar claro que a fome é criminosa e deixar pessoas passando fome e nada fazer como nossos governantes estão fazendo deve ser visto e entendido como um crime contra os seres humanos, contra a humanidade.

Nestes dois últimos anos, o que estamos presenciando é o descaso criminoso promovido pelos nossos governantes. Importante registrar que o Brasil sai do Mapa Mundial da Fome da FAO/ONU em 2013/2014, retirando mais de 97% da população da extrema pobreza, e a partir de 2015/2016 a fome retorna de forma galopante ao Brasil.

Em 2020, com a pandemia, a fome se agudiza mais, associada à miséria, desemprego, perdas dos direitos básicos, desmonte e ausência de politicas públicas por parte dos governos etc. A população em extrema pobreza, em vulnerabilidade social, recorre a alguns “subterfúgios” para driblar a fome – buscando ossos, ou a mamadeira de água com açúcar dada as crianças pequenas – que aparecem como saídas paliativas, que minimizam a sensação de fome imediata, mas que levam, com o uso continuado, à desnutrição e morte.

É a insegurança alimentar que se agrava junto à população vulnerável, e isso é visto todos os dias pelos movimentos sociais que atuam distribuindo comida, cestas alimentares, construindo barracos, enfim, tentando atender esta população hoje totalmente desassistida pelo Estado. Então conversar sobre nutrição, valor nutricional, substituição de alimentos seria tripudiar sobre as pessoas que passam fome, e associado a isso deixar de evidenciar o descaso de nossos governantes que não olham de frente a fome, a miséria e seguem priorizando asfalto, construção de estradas.

– Terceiro ponto: a Política de Segurança Alimentar e Nutricional (PNSAN) que deveria ser respeitada e implementada pelos governos. Como parte desta politica temos os Equipamentos Públicos de Segurança Alimentar e Nutricional, composto por Restaurante Popular, Cozinhas Comunitárias, Banco de alimentos. Em Florianópolis lutamos a muito desde 2014 pela criação de um Restaurante Popular público e, na pandemia, em 2020, retornamos com força esta luta. Conquistamos a inclusão na Lei Orçamentaria do município (LOAS) o valor de 1 milhão de reais destinados ao Restaurante Popular.

Até hoje este restaurante popular não se concretizou. O Restaurante Popular é um equipamento de segurança alimentar que respeita o alimento enquanto direito humano, de qualidade, em quantidades adequadas. É um espaço onde se produz, e consome alimentos fornecidos pela agricultura familiar, adquiridos via outra politica, o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) que atende tanto população em vulnerabilidade social quanto demais trabalhadores.

Desta forma, o que devemos discutir não é consumo de ossos, mas a importância de equipamentos públicos que assegurem alimentação de qualidade para todos. Contra esse quadro horrível de fome e morte, vamos às ruas no dia 18, num ato para acabar com a enrolação do prefeito Gean Loureiro e garantir Restaurante Popular público em Florianópolis, já!

Venha junto, em defesa da segurança alimentar e de alimentação enquanto direito humano básico.

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