Cinco lições do golpe na Bolívia

Por Atilio Boron, sociólogo argentino. Traduzido por Gabriel Brito, editor do Correio da Cidadania

Após os protestos massivos no Equador, no Chile e no Haiti, mais um país sul-americano mergulha em uma crise política e tem as ruas tomadas por manifestantes: a Bolívia. As motivações, no entanto, são completamente distintas. Depois de não reconhecer a legitimidade das eleições e da vitória de Evo Morales e Álvaro García Linera – reeleitos com 2,8 milhões de votos e mais de dez pontos percentuais de diferença em relação ao segundo colocado, Carlos Mesa, no pleito de 20 de outubro –, organizações políticas passaram a organizar atos violentos em várias partes do país e tentam impor sua vontade sobre a da maioria da população.

A tragédia boliviana ensina com eloquência várias lições que nossos povos e as forças sociais e políticas populares devem aprender e gravar em suas consciências para sempre.

1) Primeiro: por mais que se administre de modo exemplar a economia como fez o governo de Evo, com crescimento, redistribuição, fluxo de investimentos e melhora de todos os indicadores macro e microeconômicos, a direita e o imperialismo jamais vão aceitar um governo que não se coloque a serviço de seus interesses.

2) Segundo, há que estudar os manuais publicados por diversas agências dos Estados Unidos e seus porta-vozes disfarçados de acadêmicos ou jornalistas para poder perceber a tempo os sinais da ofensiva.

Estes escritos invariavelmente ressaltam a necessidade de destroçar a reputação do líder popular, o que no jargão especializado se chama assassinato de reputação, qualificando-o de ladrão, corrupto, ditador ou ignorante.

Essa é a tarefa confiada a comunicadores sociais, autoproclamados “jornalistas independentes”, que do alto de seu controle quase monopólico dos meios de comunicação entorpecem o cérebro da população com tais difamações, acompanhadas, como no caso que nos ocupa, por mensagens de ódio dirigidas contra os povos originários e os pobres em geral.

3) Terceiro, cumprido o anterior, chega a hora da dirigência política e as elites econômicas pedirem uma “mudança”, “fim da ditadura” de Evo que, como escrevera há poucos dias o imprestável Vargas Llosa, é um “demagogo que quer se eternizar no poder”. Suponho que está brindando com champanhe em Madrid ao ver as imagens de hordas fascistas saqueando, incendiando, prendendo jornalistas em poste, rapando uma mulher prefeita e pintando-a, destruindo atas da última eleição para cumprir com a ordem de don Mario e liberar a Bolívia de um maligno demagogo.

Menciono esta figura porque foi e é imoral porta-bandeiras deste ata que vil, esta traição sem limites, que crucifica lideranças populares, destrói a democracia e instala o reinado do terror a cargo dos bandos criminosos contratados para massacrar um povo digno que teve a ousadia de querer ser livre.

4) Quarto: entram em cena as “forças de segurança”. Neste caso estamos falando de instituições controladas por numerosas agências, militares e civis, do governo dos Estados Unidos. Essas treinam, armam, fazem exercícios conjuntos e as educam politicamente. Comprovei isso quando, por convite de Evo, inaugurei um curso sobre “Anti-imperialismo” para oficiais superiores das três armas. Nesta oportunidade fiquei impressionado com o grau de penetração das mais reacionárias consignas norte-americanas herdadas da época da Guerra Fria e pela indisfarçada irritação pelo fato de um indígena ser presidente do país.

O que fizeram essas “forças de segurança” foi sair de cena e deixar o campo livre para a descontrolada atuação das hordas fascistas – como as que atuam na Ucrânia, na Líbia, no Iraque, na Síria – para derrubar líderes incômodos ao império, e assim intimidar a população, a militância e as próprias figuras do governo. Ou seja, uma nova figura sociopolítica: golpismo militar “por omissão”, para bandos reacionários, recrutados e financiados pela direita, imporem sua lei. Uma vez que reina o terror e diante da incapacidade de se defender do governo, o desfecho era inevitável.

5) Quinto: a segurança e a ordem pública não deveriam jamais ter sido confiadas à polícia e ao exército na Bolívia, colonizadas pelo imperialismo e seus lacaios da direita local. Quando se lançou a ofensiva contra Evo optou-se por uma politica de apaziguamento e de não responder provocações dos fascistas. Isso serviu para encorajá-los e acrescentar apostas: primeiro, exigiram recontagem; depois, denunciaram fraudes e pediram novas eleições; adiante, queriam fazê-las sem Evo; finalmente, ante sua relutância em aceitar a chantagem, semearam terror com a cumplicidade policial e militar e forçaram Evo a renunciar. De manual, tudo de manual. Aprenderemos as lições?

“Meu único pecado é ser indígena e amar meu povo “,

Juan Evo Morales Ayma

– Nos anos de governo de Evo, a Bolívia deixou de ser o país mais pobre da América, para ser o país com o maior crescimento da América, este ano de 4% 

– Aumentou seu PIB em 400% – As 8 bases militares que os EUA foram eliminadas, Evo tirou a DEA e a CIA de seu país, – Gás e Água foram nacionalizados (foi estabelecido como um direito humano, pois havia sido privatizado) – 12 fábricas de lítio, 3 fábricas de cimento, 2 fábricas automotivas, 28 fábricas têxteis foram criadas e 12.694 cooperativas foram criadas, 

– Acabou a discriminação contra o indígena, e a Bolívia se tornou a República Plurinacional da Bolívia, ou seja, é reconhecida a autodeterminação e a cultura dos povos indígenas, 

– Metade dos cargos públicos são ocupados por mulheres, dos quais 68% são indígenas, 

– O salário mínimo aumentou em mil por cento, 

– Bolívia lançou seu primeiro satélite, chamado: Tupac Katarí.

–  Promulgou a Lei de Pachamama, a Lei da Mãe-Terra, que introduz a concepção indígena ancestral da Terra/ Natureza como ser vivo, com direitos, um sujeito coletivo de interesse público.

– A pensão para idosos foi criada a partir dos 65 anos e foi estabelecido um bônus para todos os estudantes da Bolívia, 

– O analfabetismo diminuiu de 22,7% para 2,3%, 

– Foram feitos mais de 25 mil quilômetros de estradas, – 134 hospitais foram construídos 

– 7 7.191 Centros Esportivos foram construídos – Cem escolas foram construídas 

– Foi criada uma nova Constituição que dava direitos a Trabalhadores, Camponeses, Estudantes, Mulheres e Povos Indígenas.

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